quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A árvore da vida



          Era noite quando eu dirigia meu carro por aquela avenida. Não me lembrava aonde estava indo, apenas deixava minha intuição me seguir. "Será que entro agora? Não, deverei entrar na próxima" indagava eu a meu coração, recebendo logo uma resposta deste. Aquela avenida por onde rodava era um pouco sinistra e mal iluminada, possuía alguns pontos de iluminação e um trecho escuro entre um poste e outro. O asfalto possuía fracas marcações, enquanto o que estava fora da avenida era totalmente escuro.
          "Vire na próxima estrada" disse meu coração, e eu obedeci. Virei em uma pequena estrada tenebrosa que parecia não ter fim. Curva lá, curva cá, até que olhei para meu lado e vejo que um enorme lobo guará acompanhava, correndo, meu carro. Meu coração não disse nada, então continuei seguindo o caminho, até que aquele animal majestoso sumiu em meio ao mato (e trevas). "Que lindo aquele animal, apreciarei a memória de sua companhia por um bom tempo!" exclamou meu coração, enquanto eu focava na estrada.
Depois de muitas subidas, descidas e curvas acentuadas, meu coração me disse que estávamos perto daquele lugar e, logo depois dele me falar isso, vejo um enorme galpão dentro de uma grande área cercada. Embora a iluminação externa do local era fraca, ela, em meio às trevas, em muito me auxiliou.
          O lugar parecia um pouco tenebroso, mas era meu destino. Não sei o que iria encontrar lá e nem o porquê de estar indo para aquele local, na verdade estava mais esperançoso de encontrar as respostas que procurava lá. Quando me aproximei do portão de acesso, eu nem parei o carro e ele já se abriu automaticamente — será que era um portão automático, ou alguém já me esperava lá? Enfim, segui o caminho de terra dentro daquele cercado e fui dirigindo até encontrar um lugar para estacionar.
"Preste atenção em teus pés e no caminho. Assim, estaremos bem" disse meu coração a mim novamente. Quando desci do carro, logo observei o galpão, que agora mais parecia um estádio de futebol. É, a fraca iluminação me enganou acerca de alguns aspectos daquele lugar minutos atrás.           Atentando ao caminho, o qual era bem acidentado e cheio de pedras, fui me aproximando perto do que parecia ser a entrada daquela colossal construção — um enorme portão cinza, que aparentava ser de ferro. Interessante que, conforme me aproximava daquele lugar, maior e mais imponente ele parecia ficar. Como a iluminação era fraca, não conseguia perceber os vários detalhes que aquele lugar parecia possuir, mas percebia que existia alguns galhos de alguma árvore que pareciam atravessar — e até mesmo contornar — as paredes daquela construção. Enquanto percorria o caminho, meu coração, em vez de ficar impaciente, já que o caminho parecia apenas aumentar, ele contemplava cada detalhe que meus falhos olhos percebiam em meio à penumbra. Ele achava tudo magnífico e temeroso, apreciava até os detalhes das pedras que se encontravam no caminho, já que algumas pareciam ter alguma preciosidade, embora fossem bem pontiagudas.
          Logo quando cheguei, os portões se abriram para mim e, quando me dei conta, já estava dentro daquele lugar — agora me encontrava dentro de um minúsculo e enigmático ginásio.
          O lugar, que possuía uma iluminação um pouco mais decente — mesmo existindo alguns pontos com nenhuma iluminação — estava com algumas pessoas. Enquanto observava, juntamente com o meu coração, aquele local enigmático, quando um homem que aparentava ter uns 48 anos, dotado de barba e um cabelo curto e grisalho, perguntou-me sobre minha pessoa. O pouco que falei — ora, havia apenas apresentado meu nome e de onde eu era — fez com que esse homem ficasse maravilhado. Ele era um professor universitário, talvez tenha me confundindo com algum aluno dele. Enfim, acabei deixando ele de lado quando percebi que havia um grupo de pessoas conhecidas na parte superior do outro lado daquele ginásio. Eles estavam sentados em volta de uma mesa, ao todo eram três homens e uma mulher, e estavam todos me aguardando. O local que eles se encontravam parecia com um camarote, que se encontrava bem acima e atrás de um dos gols. Caminhando, logo fui percebendo que pessoas surgiam e sumiam simultaneamente daquele lugar, então me dei conta que logo estava do lado daquele grupo que me aguardava. Bom, todos me receberam bem, embora eu apenas lembrasse o nome daquela moça, que era Daia. No momento que eu cumprimentei ela, percebi logo alguma exigência em seu olhar e, embora tenha cumprimentado a todos, apenas ela me tratava como um igual, já que os outros me viam como se fosse alguém importante, ou algum tipo de celebridade. A comunicação com aquelas pessoas não era verbal, pois bastava um olhar para que a outra pessoa compreendesse a mensagem que gostaria de passar, e isso parecia ser mais forte com a Daia.
          Dei uma espiada em volta e percebi que existiam duas portas. Julguei que eram banheiros, já que existia uma fila enorme para entrar em cada um deles, então resolvi entrar na porta da esquerda. Quando fui me aproximando da fila, todos me olharam e me colocaram de frente para a porta, como se a fila não fosse necessária. Antes que pudesse entrar nela, meu coração logo me disse "Não faça isso! Olhe para trás, e me deixa no comando por alguns minutos". Quando me viro, Daia me olhava com um leve — e belo — sorriso em seu rosto. Seu cabelo possuía um tom avermelhado, sendo que tal cor era semelhante às flores que brotavam nos galhos que contornavam algumas partes da parede (e que eu só havia percebido agora). Foi aí então que eu parei de pensar e apenas agi — caminhei em direção dela e, quando a alcancei, me inclinei (pois ela estava sentada), segurei delicadamente eu seu rosto e a beijei. Neste momento, caro leitor, não sei ao certo descrever — viajei por entre os cosmos e dimensões paralelas, todos meus sentidos foram dopados e elevados, minha mente começara a pensar em tudo e em nada... até me encontrar de volta em meu corpo, momentos depois. Mal havia terminado o carinho quando meu coração me fez perceber um corredor à minha direita. Olhei para ela, a fim de dizer que deveria ir por aquele corredor e, antes que pudesse abrir a boca para falar, seu rosto e seu semblante me dizia "vá", então fui.
          Esse corredor, logo em seu começo, possuía uma curva à direita, então entrei e o segui. No lugar onde eu caminhava agora era mais iluminado, agora podia ver o que iluminava, que eram algumas tochas posicionadas pela parede. Quando olhei para cima, via que o teto daquele corredor eram vários ramos ramos daquela mesma árvore que possuía todo aquele "estádio". As paredes daquele corredor eram amarelas, possuindo uma textura extremamente lisa. Depois de muito andar, me encontrei em uma pequena sala quadrada, onde haviam dois caminhos: um para uma sala bem menor e pouco iluminada, enquanto outro era apenas a continuação do corredor. Ao observar melhor, percebo que existiam duas pessoas que ficavam olhando ambos os caminhos, que estavam lacrados por largas barras verticais, que saíam do chão e pareciam atravessar a parte de cima, que estava tomada pela árvore. A postura dessas pessoas era semelhante: ambas estavam com um braço sobre o estômago, que dava suporte ao braço direito, pois cada um deles estavam com a mão no queixo, enquanto questionavam sobre as coisas em voz alta — suspeito que estavam, na verdade, pensando em voz alta. Eles frequentemente repetiam "como será possível passar por essas barras?", "será que é possível quebrar aquelas barras?" e "por que que eu estou aqui?". Enquanto ficavam lá, questionando, continuei meus passos e, quando me dei conta, estava naquela salinha! "Como eu passei por aquelas barras?" minha razão perguntava, enquanto meu coração apenas observava. Naquela sala, encontrei o esqueleto de alguém — talvez esse alguém tenha ficado preso por aquelas barras. Preocupado, me virei para investigar as barras de perto e, para a minha surpresa, noto que elas haviam desaparecido.
          Com pouco espanto e muita curiosidade, fui investigando os objetos que estavam presentes, além daquele horrendo esqueleto que descansava no chão. Então acabei encontrando uma espada, uma linda coroa de ouro (que estava na cabeça daquele esqueleto) e um enorme baú. A espada era grande, porém leve, além de parecer bem afiada. Quando a peguei, fui testar o corte dela com a unha de meu dedo indicador esquerdo — afiada! Ela possuía um guarda-mão com um revestimento dourado, e detalhes ao longo da lâmina a deixavam bastante formosa aos olhos. "Tome cuidado com ela", disse o meu coração, e continuou "ela pode tanto salvar, bem como matar". Enquanto prestava atenção ao coração, curioso que sou, fui abrindo o baú, que não possuía nenhum lacre aparente, e eis que me deparo com uma bainha feita especialmente para aquela espada, além de muitos objetos de ouro. Como não poderia levar tudo comigo, já que não possuía uma mochila, peguei a bainha (e a coloquei em minhas costas, afinal, aquela espada era longa), a coroa que estava naquele esqueleto e um lindo anel de ouro que possuía inúmeras gravuras e pequenas pedras preciosas com as mais variadas cores.
          Saindo daquele lugar, com a espada nua em minhas mãos (me sentia um pouco animado por tê-la encontrado), aqueles dois homens, que questionavam sem parar, começaram a me indagar, com muito espanto, sobre como eu havia passado pelas barras. Falei para eles que apenas andei, que havia esquecido de que aquelas barras estavam ali, explicando também que, depois que entrei, as barras haviam sumido. Quando fui apontar para a entrada do lugar de onde saí, percebi, para meu espanto, que as barras ainda estavam lá, lacrando a passagem de qualquer um que tentasse entrar.
          Fui acusado de mentiroso e desonesto, os homens falavam "você não quer que passemos por lá também, não é?" e "seu mentiroso de merda!". Enquanto me atacavam verbalmente, meu coração começou a gritar comigo "o que você está fazendo aí? Continue! Deixe eles, em nada lhe acrescentarão" e continuou "mas tome cuidado com o da direita, o da blusa verde... ele está armado, e só está esperando o momento certo para me atravessar!". Realmente, meu coração estava certo pois, no momento que me virei, escutei um som rápido de algum metal raspando em uma superfície... "uma adaga!" pensei e, rapidamente, me virei tentando me proteger com a espada que segurava.
          Não sei se foi sorte ou o destino, mas consegui tirar a adaga quando ela já havia começado a entrar na pele em meu peito. O movimento que realize, em questão, foi de tirar o metal com metal, o que causou um corte superficial — porém dolorido — na superfície de meu peito, bem na região do coração. Depois que a adaga foi lançada com a força aplicada na espada, tive a chance de decapitar o atacante. "Matar... pra quê?" meu coração me questionou, já que o pensamento da decapitação havia me passado. Sem pensar muito, acabei apenas dando um chute no rendido e disparando em direção à outra entrada, a qual estava celada pelas barras. O outro homem, que só observava, apenas observou, boquiaberto, enquanto eu atravessava aquelas barras que os delimitavam, então pelo caminho segui.
          Depois de uma considerável distância, voltei ao passo normal e continuei pelo caminho que deveria seguir, contemplando os ramos da árvore que ficavam na parte de cima. No começo, aquela ferida doía... estava machucado, mas não iria morrer. Então vez, andei... e andei, andei e andei mais um pouco. Depois de andar tanto, continuei andando... parecia a eternidade!
          Minha mente estava inquieta com aquilo, enquanto meu coração flutuava por entre meu peito... estava leve, estava feliz.
Enquanto andava, recordava das coisas que passei, daquela moça que ficou, porém me acompanhava, daquelas coisas que aconteceram, porém aconteciam... até então notar algo extremamente lindo: atrás dos ramos e galhos que cobriam a parte de cima, era possível visualizar o céu estrelado e, conforme as flores mudavam, as estrelas mudavam também; era interessante, já que, enquanto estava no carro, não podia ver estrela alguma senão trevas, mas agora, atrás das folhas e flores dessa árvore, podia ver o céu, tão bonito e misterioso, dotado de uma beleza mística! Contemplando a beleza do infinito, vejo que o chão já havia mudado; este estava já não era mais pedra, como outrora, mas sim galhos e ramos.
Andando mais um pouco, percebo que havia subido, já que, olhando também para o chão, identifiquei aquela sala por onde passava, com aqueles mesmos homens, indagando, questionando. Eles pareciam não me ouvir — já que, agora que estava andando em ramos, meu caminhar havia se tornado menos silencioso, por conta de alguns finos galhos que acabava quebrando ao pisar — e pareciam cego, afinal, era possível vê-los de onde eu estava, já que onde eu me encontrava ainda era bem iluminado.
          "Deixe eles, são culpados por estarem lá!" exclamou, novamente, meu coração. Conforme continuava pelo caminho, o corredor parecia cada vez mais fechado, por conta do aumento da presença dos ramos da árvore, que pareciam tomar conta de tudo. Cada vez que passava, mais diferentes e lindas flores eu via, só que agora elas estavam acompanhadas de belos e diversificados frutos. Como a fome já contorcia meu estômago, resolvi colher algumas, foi aí então que percebi o quão resistente eram aqueles ramos, tanto é que eu precisei usar a espada pra poder soltar algumas frutas de alguns galhos. Peguei uma que havia me chamado a atenção dos olhos (e do coração), era uma vermelha, parecida com uma pimenta, mas que tinha gosto de maçã! Tão suave de se mastigar, juro que estava com medo de que fosse realmente pimenta mas, confiando no coração (e na intuição), mordi vigorosamente a fruta.
          Chegou um momento que me encontrei indeciso: encontrava-se em um cruzamento entre alguns corredores! Ah, a indecisão... cada caminho parecia mais belo que o outro! O da minha esquerda era mais largo, possuindo algumas lindas estátuas de alguns cavalos. Já o da esquerda parecia ser mais alto, mais colorido e mais perfumado. Enquanto parava e ponderava por onde seguir, meu coração repetia, a cada batida, a palavra "Vá!", então fui — segui o caminho que já seguia sem medo algum.
          O que direi para você agora, leitor? Algum fim, alguma conclusão? Como saberei te explicar o que ainda não veio, o que ainda não se revelou?
          Então, ainda sem resposta do porquê estou aqui, continuarei andando e relatando, até então conhecer toda essa árvore que me acompanha o caminho. Quem sabe, um dia, não receba a explicação de tudo isso? Esse é o meu crer, essa é a minha esperança.

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